18 setembro, 2008

Um outro certo Capitão Rodrigo

A natureza e a mãe já tinham lhe dado meio caminho; os olhos azuis aquilares e o nome: Rodrigo. Respectivamente. Porém, não era o bastante para ele, que passara a amar Erico Veríssimo após ler oito vezes seguidas “O Continente” (mais precisamente o capítulo: Um certo Capitão Rodrigo).

O estopim de tudo fora aceso quando uma colega de serviço resolvera, no seu aniversário, fazer uma festa à fantasia. Pronto!Era o motivo que ele precisava. Resolvera ir vestido de Capitão Rodrigo Severo Cambará. E foi.

Mandara fazer uma túnica, tal e qual a do Capitão, colocara um bigode postiço, comprara, numa tacada só as bombachas brancas, o chapéu (que nunca fora usado como deveria e sim sempre recostado à nuca), o lenço vermelho, as botas, as esporas e o violão, porém faltava-lhe a espada. Arranjara a lâmina na véspera, com um amigo.

Na festa, a interpretação fora perfeita. Falava mais alto que todos, dava em cima das “piguanchas”, comia de um modo barulhento e quando bebia o líquido escorria-lhe pelos bigodes e pela face, derramando sempre um grande volume das bebidas. Todos riam muito. Ao final, todos parabenizaram-lhe pela “atuação” que culminara com o prêmio de fantasia mais original (“prêmio surpresa”, dissera Regina, dona da festa).

O que surpreendera a todos, foi que na segunda-feira subseqüente o Rodrigo avançara escritório adentro com a mesma fantasia, bradando:

-Buenas e me espalho! Nos pequenos dou de prancha e nos grandes dou de talho!
-Tá, Rodrigo!! A festa foi no sábado. Acabou a palhaçada! –retrucara um colega que tinha o apelido de “esquentadinho”.
-Por acaso te chamas Juvenal??- perguntara Rodrigo, com um ar provocativo.
-Não. Tu sabes que o meu nome é Breno. –respondera o esquentadinho.
-Então não me dirijas a palavra...

E nos dias que se passaram trocara o pseudobigode por um verdadeiro. Passara a chamar as colegas e todas as mulheres que cruzavam seu caminho de “china”. Vendera o carro e comprara um cavalo porque, dizia ele, “não hai nada melhor para pelear que um bom cavalo”. Brigara com outro colega só porque seu sobrenome era “Amaral”.

Seus exageros eram cada vez mais improváveis. Mudara até sua alimentação, pois passara a comer somente carreteiro de charque, lingüiça frita e um bom churrasco, todos sempre regados a guampas e mais guampas de cachaça. Os cortejos vinham sempre acompanhados da fatídica pergunta:

-Por acaso seu nome não é Bibiana?? Hein, minha prenda??

Um dia, sua mãe (que ele já negara, pois o Capitão não tinha mãe) já cansada da insanidade do filho, aproveitara-se do momento em que Rodrigo tirava sua sesta, armara, com pesar no coração, sua remoção para uma clínica psiquiátrica.

Nos três anos de intensa terapia, Rodrigo apresentara melhora significativa, sendo tratado por uma psiquiatra, de perto, mas tão de perto que acabaram apaixonando-se.

E vieram o noivado, casamento marcado e sacramentado.

Na noite de núpcias, quarenta minutos de preliminares já se iam, quando Rodrigo interrompera, acendera a luz do abajur e perguntara à recém esposa:

-Teria algum problema se na hora “H” eu te chamasse de Bibiana?? Hein, minha prenda??

3 comentários:

Anônimo disse...

Deixo aqui registrada minha homenagem a todo o povo gaúcho por este 20 de setembro!

E meus parabéns ao Luciano, pelo belo conto inspirado no grande Érico Veríssimo!

Abraços!!!

Marcos Seiter disse...

Com licença, vizinho!!!

Encontrei seu blog no comentário feito no penúltimo texto do David.

Estou lendo neste momento a trilogia.

Linkarei-o e voltarei para ler este conto.

Abs

Marcos Seiter disse...

Bah, se a prendar for com a cara e incorporar a alma da trilogia, ela aceitará. Caso o contrário é sossegar-se e só pensar em Bibiana. **risos**

Abs e bom domingo!!!


Marcos Seiter